quinta-feira, 1 de maio de 2008

Revelée

Numa noite qualquer em Nova Iorque, a ouvir o Carl Craig, num Clube cujo nome não me lembro. Gosto muito do Carl Craig. De joelhos à minha frente, no escuro, uma boca qualquer faz o que tem a fazer. Tenho um copo de vodka na mão e os olhos semi-cerrados, a cabeça ao som do ritmo. Sinto que a minha vida é apenas um mau filme de um italiano dos anos 60, cheio de brilho e luxo e surpresas, mas sem significar absolutamente nada. Não sou capaz de amar nada nem ninguém por mais de trinta segundos. Estou rodeado de pessoas belas, jovens e disponíveis, na mesma situação que eu e isso não me alegra. Gosto do Carl Craig. Por enquanto. Quando sair daqui, vou copiar a cena da Sharon Stone e do futebolista inglês na abertura do Basic Instinct 2. Tenho o Spyker lá em baixo e a boca que está de joelhos à minha frente nem vai saber o que lhe acontece. A miúda até é gira, tem todas as qualidades que eu aprecio. Mas não quero saber dela para nada. Quero que ela se foda. Gosto do Spyker. Por enquanto. Há barulho, luzes, reflexos, espelhos, corpos, calor, movimentos sincopados, como se um conjunto de espectros bem vestidos tentasse divertir-se a todo o custo. Quero gritar e não me sai qualquer som da garganta. O costume. Acelero o Spyker pelas ruas de Nova Iorque, como numa cena realizada por Michael Mann. Não, nada disso, preciso de algo mais superficial. Esta cena está a ser realizada por Tony Scott. Sim, filtros, câmara ao ombro, brilhos e reflexos... Música de Carl Craig. Anti-climax. A miúda gira grita que se farta e estraga o ambiente. Páro o carro, numa nuvem de borracha e atiro-a dali para fora. O vestido John Galliano dela rasga-se e fica preso à porta, flutuando ao lado do carro enquanto acelero para fora dali. Apetece-me matar alguém. Limito-me a conduzir sem destino até se acabar a gasolina. Tenho 30 anos, sou rico, giro e a minha vida é um simulacro da vida de um ser humano real. Gosto da Sharon Stone, mas agora não me posso preocupar com isso. Over and out.

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